domingo, 6 de maio de 2012

Soneto Comentado (Luís de Camões)


Eu cantarei de amor tão docemente,
por uns termos em si tão concertados,
que dois mil acidentes namorados
faça sentir ao peito que não sente.

Farei que amor a todos avivente,
pintando mil segredos delicados,
brandas iras, suspiros magoados,
temerosa ousadia e pena ausente.

Também, Senhora, do desprezo honesto
de vossa vista branda e rigorosa,
contentar me hei dizendo a menos parte.

Porém, para cantar de vosso gesto
a composição alta e milagrosa,
aqui falta saber, engenho e arte.


(Luís de Camões)


Amor 

Amor, que o gesto humano n'alma escreve,
vivas faíscas me mostrou um dia,
donde um puro cristal se derretia
por entre vivas rosas e alva neve.

A vista, que em si mesma não se atreve,
por se certificar do que ali via,
foi convertida em fonte, que fazia
a dor ao sofrimento doce e leve.

Jura Amor que brandura de vontade
causa o primeiro efeito; o pensamento
endoidece, se cuida que é verdade.

Olhai como Amor gera num momento,
de lágrimas de honesta piedade,
lágrimas de imortal contentamento.

(Luís de Camões)



Um comentário:

  1. Du, sempre belas e delicadas postagens que nos tocam a alma.
    Um grande abraço

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